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Instituto Procomum utiliza práticas de cuidado para tratar e discustir ansiedade climática

Sentimento e incerteza causados pela ansiedade climática levam a um sofrimento psíquico causado pela percepção de que estamos sendo afetados por algo que está fora do nosso controle.

Temperaturas extremas, seca, ciclones mais intensos e com temporadas cada vez mais longas, incêndios, degelo dos polos, são alguns exemplos que eventos climáticos que podem causar ansiedade climática | Foto: NOAA


As mudanças climáticas podem afetar nossa saúde, capacidade de cultivar alimentos, habitação, segurança e trabalho, segundo a ONU. Com o alto número de queimadas e os recentes períodos de seca no país, a preocupação com o meio ambiente aumentou entre a população e um levantamento do Google Trends mostrou que, nos últimos cinco anos, as pesquisas sobre "ansiedade climática" aumentaram 73 vezes no Brasil.

Para a psicóloga Luiza Xavier, coordenadora de Comunidades e Mobilização do Instituto Procomum, a ansiedade climática se dá pelos impactos subjetivos — no trabalho, na vida pessoal, e até na forma de se relacionar com os outros — relacionados à antecipação de eventos climáticos.

“Basicamente, é o medo e a apreensão sobre como algo, como a fuligem de um incêndio, pode impactar o cotidiano, ou a incerteza sobre se o morro onde a pessoa mora vai deslizar com a chuva. Esse sentimento e incerteza leva a um sofrimento psíquico causado pela percepção de que estamos sendo afetados por algo que está fora do nosso controle individual”, explica ela.


Um estudo internacional conduzido pela Lancet Planetary Health, em 2021, revelou dados sobre o impacto psicológico das mudanças climáticas, especialmente em jovens. A pesquisa foi realizada em 10 países e envolveu 10 mil jovens entre 16 e 25 anos.

Ao serem questionados, 59% dos entrevistados disseram que se sentem "muito" ou "extremamente" preocupados com as mudanças climáticas, enquanto 84% afirmaram que estão ao menos moderadamente preocupados. Além disso, 75% concordaram com a afirmação de que o "futuro é assustador" devido às mudanças climáticas e 56% acreditam que a humanidade está condenada por conta da crise climática.

De acordo com Luiza, existem dois tipos de públicos diferentes: aqueles que, diariamente, são bombardeados com notícias sobre a crise climática, como a mudança de temperatura, os refugiados climáticos e as queimadas, e outros que já vivem em áreas de risco real e iminente. “Quem mora, por exemplo, em um morro que pode sofrer deslizamento de terra ou perto de um incêndio florestal lida com isso diretamente, o que potencializa a ansiedade. Esses eventos extremos mexem com o cotidiano e com a forma de enxergar o mundo”, afirma.

 

 Além disso, ela pontua que quando falamos sobre adoecimento e transtornos psíquicos, existe um aspecto político e social envolvido, além das questões biológicas. Para a coordenadora de Comunidades e Mobilização do Instituto Procomum, há também uma produção de adoecimento que é fruto da sociedade e do tempo em que vivemos: “A ansiedade climática também reflete esse cenário social e político, mostrando como os transtornos psíquicos estão conectados aos problemas globais que enfrentamos hoje”.

Assim, na opinião da especialista, um dos principais desafios da comunidade nessa temática é o reconhecimento. A saúde mental é multidimensional e os fatores culturais, sociais e ambientais contribuem para o bem-estar ou o adoecimento psíquico. Com isso, ela explica que o tratamento de transtornos se torna mais complexo, pois não há uma solução única que funcione para todos.

Outro desafio é a falta de visibilidade e de aceitação dessas questões, tanto por parte da sociedade quanto dentro dos sistemas de saúde. “É essencial que a gente consiga falar sobre como as mudanças climáticas afetam a saúde mental e que isso seja levado a sério”, diz Luiza Xavier.

Assim, ela afirma que é necessário incorporar essa discussão nos serviços de saúde, tanto públicos quanto privados, e que a ansiedade climática seja reconhecida e incorporada pelas políticas públicas de saúde e assistência. Para isso, é necessário capacitar profissionais e criar políticas específicas para lidar com os impactos subjetivos das mudanças climáticas.

“Precisamos reconhecer os impactos materiais, como a fumaça das queimadas, e os imateriais, como o sofrimento psicológico, e trazer essa perspectiva para os equipamentos de saúde pública, de modo que essa questão seja tratada de maneira integral” — Luiza Xavier.

O Instituto Procomum e a ansiedade climática

A coordenadora de Comunidades e Mobilização do Instituto Procomum comenta que em meio às questões climáticas, são realizados projetos que incorporam práticas de cuidado. “Falar sobre certas temáticas, especialmente com pessoas em situação de vulnerabilidade, é delicado, então sempre oferecemos espaços de escuta, acolhimento e encaminhamento”, explica.

Em eventos maiores do Procomum, Luiza relata que há uma infraestrutura de cuidado, com profissionais à disposição para oferecer suporte físico e emocional.

No laboratório cidadão do instituto, também existe um grupo que oferece práticas integrativas de cuidado à comunidade local a cada 15 dias. “Elas têm acesso a esse

 

 cuidado contínuo, e, quando necessário, as encaminhamos para serviços de saúde públicos ou privados”, comenta a psicóloga.

O Procomum ainda tem um convênio com a Unifesp, que apoia o instituto com estágios em psicologia para atendimentos clínicos duas vezes por semana. “Esse estágio tem sido fundamental para discutir os impactos subjetivos das mudanças climáticas, um tema que ainda não é amplamente abordado nos cursos de psicologia, mas que estamos integrando na formação desses profissionais”.

Além disso, os membros do Instituto Procomum se reúnem mensalmente com profissionais de saúde e assistência social de Santos para discutir temas relevantes, sempre destacando a importância de incluir as mudanças climáticas nas discussões de saúde mental.

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